3 juin 2008

era uma vez uma estorinha de primavera, e o fato é que eu passei muito tempo escrevendo aquelas coisas, mas agora parece que o tempo todo faltava algo. não na primavera: porque havia magnólias enormes como melões, pássaros espreguiçando-se nos fios, aquela menina tecendo um vestido, mas nada muito além disso, afinal -- o que existe, na primavera, além de flores? o que existe numa estação, além dos clichês comuns? nada de relevante, eu penso; nada mesmo.
ah sim; e girassóis. girassóis são sempre relevantes, mesmo durante a noite, quando eles servem de cabaret para abelhas efusivas e excessivamente maquiadas, gafanhotos ébrios, mariposas tristes, assim por diante.
mas eu estava falando da coisa faltando. pensando melhor, se há uma ausência de algo, é porque esse algo se escondeu, morrendo de medo de ser comentado. eu sei que tem algo muito muito grande prestes a subir até fazer borbulhar a superfície, tremelicando toda a membrana lisa como vidro de uma água qualquer; mas talvez não haja nada. talvez não seja nada, me parece que será apenas uma pequena bolha de ar, nada grande o bastante para morrer de suspiros. quase nunca é.
então talvez eu possa dormir um pouquinho e descansar um pouquinho e não pensar mais nisso, não pensar em coisa alguma além das magnólias apodrecendo como velhos corpos no chão, perfumando o ar rosado como as coisas que, um dia, simplesmente serão.